Para todos da comunidade de esclerose múltipla (EM) a pandemia pelo novo coronavírus (COVID-19) trouxe muitos motivos de preocupação, seja pela possibilidade de ter um curso mais grave da infecção, desencadear uma reativação da EM ou mesmo por ter consequências neurológicas ainda desconhecidas.
Quando nos preocupamos com a possibilidade de desenvolver a forma grave da COVID-19 temos que levar em consideração principalmente os fatores de risco já conhecidos, como pressão alta, diabetes, obesidade, doenças cardíacas, doenças pulmonares, câncer, além da idade avançada.
Mas e em relação às medicações utilizadas para a EM, não poderiam ser um fator de risco? Especialmente as de alta eficácia, por induzirem maior impacto sobre o sistema imune?
Esta tem sido desde o início uma preocupação de todos devido à escassez de informações disponíveis, conforme já comentado previamente por nós, incluindo recomendações a cerca do novo coronavírus (SARS-Cov-2).
Porém, novas evidências vêm sendo acrescentadas dia após dia, com estudos com maior número de pessoas com EM que apresentaram a COVID-19. Inclusive, aqui no Brasil, estudo em andamento conduzido pela Academia Brasileira de Neurologia (ABN) está avaliando esta importante questão.
Estudo global com pacientes em uso de ocrelizumabe
Neste mês de maio foi aceito para publicação estudo que incluiu 100 pessoas com EM de diversos países que desenvolveram COVID-19 e estavam em uso do medicamento ocrelizumabe (Ocrevus®), um imunobiológico considerado de alta eficácia, com efeitos imunossupressores, ainda que moderados.
Dos 100 pacientes analisados neste estudo a maioria eram mulheres, com idade média de 42 anos. Necessitaram internação 26% dos casos, sendo que 13 já tinham recebido alta e 13 ainda estavam internados quando se analisaram os dados. Dos ainda internados, 5 encontravam-se em UTI e, destes, 1 em ventilação mecânica, estando os demais em fase de melhora, não sendo descrito nenhum óbito.
São mencionadas algumas limitações pela própria natureza do estudo, por ser de farmacovigilância, quando pessoas relatam voluntariamente eventos adversos, intercorrências de qualquer natureza, como o caso de infecções. No entanto, os dados apresentados nesta série de casos se mostram compatíveis com os estudos com a população em geral que desenvolveu a COVID-19.
Tais dados nos trazem informações importantes, dando suporte tanto para o início de um novo tratamento com ocrelizumabe quanto à manutenção daqueles já em uso da medicação, devendo estas indicações serem discutidas, caso a caso, com o neurologista assistente.
Concluindo, embora seja muito cedo para tirar conclusões concretas, com base nos dados limitados disponíveis até o momento, não há evidências que sugiram um curso mais grave da COVID-19 na EM tratada com ocrelizumabe. Esperamos trazer em breve outros estudos sobre este assunto e incluir outras DMTs, tão logo estas evidências estejam disponíveis.
Referências
Richard Hughes , Rosetta Pedotti , Harold Koendgen , COVID-19 in persons with multiple sclerosis treated with ocrelizumab – a pharmacovigilance case series, Multiple Sclerosis and Related Disorders (2020), doi: https://doi.org/10.1016/j.msard.2020.102192
Sormani MP, on behalf of the Italian Study Group on COVID-19 infection in multiple sclerosis. Lancet Neurol. 2020 Apr 30. doi: https://doi.org/10.1016/ S1474-4422(20)30147. [Epub ahead of print].