Vamos tratar neste post de um estudo recente, que nos traz informações valiosas em relação ao avanço dos métodos diagnósticos na esclerose múltipla (EM), tema da maior relevância tanto para os neurologistas quanto para todos que estão em processo de investigação para seus sintomas e com suspeita desta condição.
A EM é uma doença crônica inflamatória do cérebro e da medula espinhal. Assim, seu diagnóstico não é obtido isoladamente por um único sintoma ou exame, mas sim por um conjunto de resultados clínicos, laboratoriais e de imagem.
Um dos exames utilizados para esse fim é o estudo do líquido cefalorraquidiano (LCR), ou líquor, onde se realiza a pesquisa das bandas oligoclonais (BOC), que tem como objetivo detectar se há a presença de certos anticorpos vistos com frequência na EM.
O exame das bandas oligoclonais (BOC) é muito importante pois, quando bem feito, pode ajudar não somente no diagnóstico mas, mais ainda, sugerir ao médico e ao paciente que se trata de uma situação com chance de evolução mais rápida do quadro, possivelmente guiando o tratamento.
Porém, mesmo sendo de grande auxílio, uma parcela dos indivíduos com EM apresenta resultado negativo no teste das bandas oligoclonais (BOC) no líquor. Este fato é especialmente relevante em nossa população, pois apresentamos menor frequência deste marcador quando comparamos com norte-americanos e europeus, o que poderia causar maior dificuldade no processo de diagnóstico.
Sobre o novo estudo
Olhando para pacientes que fizeram o estudo do líquor e não apresentavam bandas oligoclonais, um grupo de cientistas quis avaliar a eficiência de outro tipo de teste diagnóstico: a detecção de “cadeias leves livres” no líquor. Exame novo para todos da comunidade de EM, certamente, que vamos explicar melhor a seguir.
Os nossos anticorpos, chamados de imunoglobulinas, são constituídos de partes, ou “cadeias” chamadas “leves” e “pesadas”. Com o avanço dos métodos diagnósticos, hoje conseguimos medir somente a porção “livre” destas “cadeias leves”, que foram alvo de pesquisa em relação ao diagnóstico da esclerose múltipla.
O estudo foi publicado este ano no Jornal Europeu de Neurologia (European Journal of Neurology) e tem como título “Cadeias leves livres do tipo kappa e lambda no líquido cefalorraquidiano de pacientes com suspeita de esclerose múltipla e resultado negativo das bandas oligoclonais”.
Os testes foram feitos em pacientes diagnosticados com esclerose múltipla, tanto com resultados negativos quanto positivos para as bandas oligoclonais (BOC). Testaram também pacientes com outras condições neurológicas, para se analisar quão específico é o método.
Os autores estabeleceram um índice de razão entre as concentrações destas “cadeias leves livres” no líquor e no sangue, para tentar determinar um valor de corte adequado que conseguisse prever a presença da esclerose múltipla com máxima eficiência.
E quais foram os resultados?
Os resultados foram promissores, mostrando que um índice do teste maior que 5,8 estava presente em ¼ dos pacientes que eram negativos para BOC. Interessante, não? Imagine quantas pessoas da comunidade de EM já fez o teste para pesquisa de BOC e ele foi negativo…
Outro ponto importante: dos pacientes positivos para BOC quase todos eram positivos para o novo teste das “cadeias leves livres” usando o índice mencionado.
Por fim, um último ponto a ser destacado foi que, nos pacientes que eram BOC negativos e não tinham esclerose múltipla, os maiores índices das “cadeias leves livres” do tipo kappa foram encontrados naqueles com Síndrome Clinicamente Isolada, condição que pode representar o primeiro sintoma da esclerose múltipla.
Perceber estas alterações permitiu prever melhor a presença da esclerose múltipla, principalmente em pacientes BOC negativos, além de ajudar a diferenciar os quadros de EM com outros semelhantes, como a Síndrome Clinicamente Isolada, mencionada acima.
A pesquisa ressaltou bastante a indicação de se estudar no líquor não somente o teste das bandas oligoclonais (BOC) mas também a identificação e determinação do índice kappa. Juntas, teriam o potencial de melhorar tanto o diagnóstico quanto o prognóstico (evolução).
Mais estudos sobre a pesquisa das cadeias leves livres precisam ser ainda desenvolvidos para que sua eficiência seja amplamente testada. Mas, no momento, resultados como esses são realmente promissores. Esperamos em breve trazer mais pesquisas abordando este tema aqui no portal.