Apesar de pouco conhecidos e estudados, os hábitos alimentares e o estado nutricional de indivíduos com esclerose múltipla (EM) sugerem que os mesmos podem sofrer diferentes desequilíbrios nutricionais. Dentre esses, destacam-se obesidade (mais comum), caquexia, baixo peso e deficiências vitamínicas. Caso ocorram, deficiências vitamínicas podem interferir no funcionamento adequado do sistema imunológico e nos sintomas da doença, sendo as mais importantes as vitaminas A e D (moduladoras do sistema imunológico), C, E, e B12 (importante para a síntese de mielina).
Dentre os minerais importantes para nutrição na esclerose múltipla pode-se destacar o zinco, o selênio e o magnésio, por suas atividades antioxidantes, dentre outros.
Além dos nutrientes citados, estudos sugerem papel na prevenção, no controle dos sintomas e possíveis comorbidades associadas com o consumo dos óleos de peixe e linhaça (ômega 3), pelo seu papel imunomodulador, anti-inflamatório e antioxidante.
A pesquisa das ações imunomodulatórias dos micronutrientes iniciou-se com estudo da vitamina D, um hormônio esteroide obtido na pele a partir da exposição solar e, em menor proporção, na dieta. Entre seus efeitos inclui a modulação da resposta imune tanto inata (células de defesa mais gerais, sem especificidade) quanto adaptativa (células que geram anticorpos, p. ex).
Uma vez estabelecida esta relação, estudos em modelos animais comprovaram as propriedades neuroprotetoras da vitamina D, abrindo precedentes para que estudos em humanos fossem realizados. Um dos mais importantes estudos na área encontrou que a suplementação de 400 ui diárias de vitamina D foi capaz de reduzir o aparecimento de novos casos e parece diminuir a severidade da doença. Existem ainda trabalhos que demonstram seu papel na susceptibilidade genética ao menos de alguns indivíduos à EM.
Ainda não existe uma recomendação formal para aplicação de um protocolo de dietoterapia específico para a doença, embora evidências têm se acumulado favorecendo o emprego de dietas pobres em gorduras. A primeira destas dietas foi desenvolvida por Roy Swank, na década de 50, caracterizada por uma quantidade baixa de gorduras saturadas, não excedendo 15 g e realizando a suplementação com óleo de fígado de bacalhau. Uma versão modificada desta dieta, a dieta McDougall, vem sendo estudada e, recentemente, mostrou-se útil no combate à fadiga relacionada à EM.
Além do controle da quantidade de gorduras saturadas na dieta, são preconizadas condutas nutricionais semelhantes aos indivíduos não portadores de EM, de acordo com a individualidade bioquímica do paciente e as recomendações vigentes. Deve-se priorizar a qualidade da alimentação, no intuito de manter ou recuperar o estado nutricional dos pacientes e evitar doenças crônicas como obesidade, diabetes tipo 2, hipertensão arterial sistêmica, dislipidemias e doenças cardiovasculares.
A tabela abaixo exemplifica as fontes alimentares dos principais micronutrientes envolvidos na Esclerose Múltipla:
NUTRIENTES | FONTES ALIMENTARES |
VITAMINA A | Vegetais folhosos verdes escuros (brócolis, acelga, rúcula, espinafre, couve verde escuro) e frutas e verduras amarelo-alaranjadas (mamão, manga, abobora, cenoura, laranja), ovos e produtos lácteos; |
VITAMINA C | Frutas cítricas e sucos (laranja, limão, acerola, goiaba) hortaliças (couve, brócolis, tomate); |
VITAMINA B12 | Carnes magras cozidas, leite e ovo; |
VITAMINA D | Peixes, óleo de fígado de peixe, ovos e vegetal folhoso verde escuro; |
VITAMINA E | Óleos vegetais, sementes oleaginosas (nozes, castanhas, amêndoas, sementes de abobora e girassol, linhaça), abacate, açaí, gérmen de trigo, salmão, atum, cavala e sardinha; |
ZINCO, MAGNÉSIO, SELÊNIO (MINERAIS ANTIOXIDANTES) | Levedura, ostras, folhas de coentro, folhas em geral (rúcula, brócolis, espinafre, acelga, couve), oleaginosas (castanha do Brasil, amêndoa, amendoim, granola, nozes, avelã), cereais integrais, abacate, beterraba, banana nanica e leguminosas (lentilha, ervilha,grão de bico,feijão),semente de girassol torrada, salmão, alho e cogumelo crus. |
OMEGA 3 | Peixes de aguas profundas (salmão, sardinha, atum, cavalinha, bacalhau), óleo e semente de linhaça e sementes de chia, além de folhas verdes e oleaginosas (menor quantidade). |
De um modo geral sabe-se que os alimentos lácteos e os que contem glúten apresentam uma maior carga alergênica, podendo assim eventualmente influenciar no quadro clínico da doença. Após uma avaliação nutricional pode ser indicada a diminuição do consumo desses alimentos e suas respectivas substituições para manter uma alimentação mais variada e saudável, como descrito a seguir.
Leite de vaca:
Pode ser substituído por leites de arroz, macadâmia, quinua, aveia e amêndoas.Alimentos também ricos em cálcio: couve, couve flor, mostarda e outros vegetais, algas marinhas, repolho, brócolis, oleaginosas, pasta de gergelim, leguminosas (feijão, grão de bico, lentilha, ervilha), quinua, amaranto, farinha de semente de abóbora e figos secos.
Trigo (glúten):
Fécula de batata, fécula e farinha de arroz, farinha de milho, tapioca, polvilho, trigo sarraceno, milho, inhame, mandioca, aipim, mandioquinha, cuscuz, quinua, amaranto, banana da terra e batata doce.
Vale ressaltar a importância do consumo dos alimentos orgânicos, livres de agrotóxicos e da sua correta higienização, associados a uma alimentação colorida, a hábitos de vida saudáveis para se manter o bom funcionamento e a vitalidade do corpo e da mente. Os aspectos nutricionais também estão relacionados com as medicações administradas, seus efeitos colaterais e possíveis depleções de nutrientes, a sintomatologia, os hábitos inadequados e as comorbidades, exigindo assim uma abordagem multidisciplinar e individualizada com cada paciente.
Referências
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