As diferentes formas da Esclerose Múltipla
A esclerose múltipla (EM) é uma doença rara que acomete o sistema nervoso central principalmente de mulheres jovens entre 20 e 40 anos. É uma doença inflamatória e de caráter autoimune em que o paciente desenvolve lesões desmielinizantes no cérebro e medula espinhal. As manifestações da doença podem ser variadas levando a uma ampla lista de sinais e sintomas.
A história natural da esclerose múltipla, isto é, como a doença se comporta ao longo dos anos, também é variável. É com base nas diferentes formas de apresentação e evolução que podemos classificar a EM em três formas principais: EM Remitente Recorrente (EMRR), EM Secundariamente Progressiva (EMSP) e Primariamente Progressiva (EMPP).
Esclerose Múltipla Remitente Recorrente
É a forma mais comum de EM, representando cerca de 85% dos casos. Recebe esse nome por se manifestar através de surtos ao longo da vida do paciente. Esses surtos, em sua maioria, evoluem para remissão, ou seja, melhoram e o paciente volta ao seu estado prévio ao evento. Ao longo dos anos, principalmente sem tratamento específico e a depender das características da doença, o paciente pode recorrer e ter novos surtos.
Quando um paciente apresenta um primeiro e único surto, muitas vezes o diagnóstico de EMRR não poderá ser fechado. Nesse primeiro momento o paciente tem a chamada Síndrome Clínica Isolada (CIS). Uma parcela dos indivíduos com CIS pode vir a desenvolver EMRR. Em outras, pode ter sido apenas um único evento isolado.
Quando o paciente apresenta um novo surto, isto é, um novo déficit neurológico, distinto do primeiro e após um intervalo de pelo menos 30 dias, é preenchido um conceito fundamental para o diagnóstico da EM: a “disseminação no tempo e no espaço”, como já discutido anteriormente.
Esclerose Múltipla Secundariamente Progressiva
Pacientes com EMRR podem evoluir após alguns anos para uma forma progressiva da doença: a Esclerose Múltipla Secundariamente Progressiva (EMSP). Esse tempo é variável, mas costuma ocorrer em média 15 anos após o início da EMRR, sendo mais comum nos pacientes sem tratamento.
Nessa forma, o paciente passa a apresentar uma evolução gradual, com menor quantidade de surtos, porém com uma piora constante da função neurológica, determinando a fase progressiva.
No início da doença não é possível determinar quais serão os pacientes que evoluirão para a forma EMSP. Somente com o tempo e com a evolução clínica é possível identificar que o paciente está transitando para uma forma secundariamente progressiva.
No entanto, existem alguns preditores que podem indicar maior risco de evoluir para a EMSP: pacientes do sexo masculino, aqueles com lesão medular, tabagistas, obesos e os que apresentam níveis reduzidas de vitamina D.
É importante, portanto, atuar nos fatores modificáveis listados acima enquanto implementa-se em paralelo o tratamento com drogas modificadoras de doença. A dieta adequada e prática de atividade física evitando o ganho de peso, a cessação do tabagismo e a reposição de vitamina D são estratégias aconselhadas para todos os pacientes com EM.
Esclerose Múltipla Primariamente Progressiva
Aproximadamente 10 a 15% dos pacientes com EM tem uma evolução progressiva desde o início dos seus sintomas. Ao contrário da EMRR, que apresenta surtos recorrentes, nessa forma eles seriam menos frequentes. Na EMPP o paciente pode apresentar um primeiro surto, e, a partir de então, ocorrer uma piora progressiva por um intervalo mínimo de 12 meses, caracterizando a progressão.
Para estabelecer o diagnóstico de EMPP é necessário primeiro a confirmação de progressão de incapacidade por pelo menos um ano. Além disso, o médico levará em consideração para o diagnóstico critérios a serem observados na ressonância magnética de encéfalo e medula, além da análise do líquor.
Uma outra diferença da EMPP é que nessa forma não ocorre o acometimento preferencial do sexo feminino como ocorre na EMRR. Enquanto na EMRR, as mulheres são mais acometidas em uma proporção de 3:1, na EMPP homens e mulheres tem taxa de acometimento semelhante, com proporção de 1:1. Além disso, a idade média de início é mais tardia quando comparada com EMRR, sendo observado pico de incidência entre 40 e 50 anos.
Figura 3: Gráfico representando a forma de evolução dos pacientes com EMPP: desde o princípio da doença, esses pacientes apresentam deterioração neurológica sustentada, sem períodos de piora aguda bem evidentes.
Diferenciar os tipos de EM é importante na condução adequada do paciente uma vez que o tratamento a ser instituído depende dessa classificação. Nem sempre a diferenciação é fácil. Quando o diagnóstico é feito de forma tardia, pode ser um desafio fazer a distinção principalmente entre EM Primariamente Progressiva e EM Secundariamente Progressiva. Nesses casos, a história detalhada do indivíduo é uma peça fundamental.
Referências
Galea I, Ward-Abel N, Heesen C. Relapse in multiple sclerosis. BMJ. 2015;350:h1765. Published 2015 Apr 14. doi:10.1136/bmj.h1765
Green,A; Waubant E. Genetics and Epidemiology od Multiple Slerosis. CONTINUUM: Lifelong Learning in Neurology; October 2007, Vol 13. doi: 10.1212/01.CON.0000293641.98116.51
Lublin FD, Baier M, Cutter G. Effect of relapses on development of residual deficit in multiple sclerosis. Neurology. 2003;61(11):1528-1532. doi:10.1212/01.wnl.0000096175.39831.21
Kantarci, O. H. Phases and Phenotypes of Multiple Sclerosis. CONTINUUM: Lifelong Learning in Neurology, 25(3), 636–654. doi:10.1212/con.0000000000000737