“Don`t go where the path may lead; go instead…
and leave a trail”
Ralf Waldo Emerson (1803-1882)
A Esclerose Múltipla (EM) é uma doença inflamatória que acomete o sistema nervoso central (SNC). Na sua forma mais frequente, chamada remitente-recorrente (EMRR), caracteriza-se por surtos de sintomas neurológicos que ocorrem em questão de horas a dias, seguidos por períodos de remissão completa ou parcial, ocorrendo em momentos e localizações variadas. A doença ainda não tem um marcador diagnóstico específico.
Nesta definição vemos descritos os três elementos essenciais para o diagnóstico da EM:
– A disseminação espacial: os surtos clínicos expressando episódios inflamatórios agudos acontecendo em áreas diversas do SNC;
– A disseminação temporal: estes episódios acontecendo em momentos distintos na história da doença;
– A necessidade de um diagnóstico diferencial cuidadoso e sistemático, visando afastar outras possibilidades que “melhor expliquem” os sintomas.
A aplicação destes critérios, que se baseava exclusivamente em sinais e sintomas, exigindo assim pelo menos dois surtos clínicos para sua confirmação, foi impactada nos anos 90, por dois fatores. O primeiro, o advento das drogas imunomoduladoras, com propriedades modificadoras da doença, passando a exigir um diagnóstico o mais precoce possível. O segundo, o desenvolvimento da imagem por ressonância magnética (IRM), produzindo uma transformação radical no entendimento da EM, permitindo, pela primeira vez, a vizualização objetiva e “in vivo” das lesões, tanto as agudas quanto as crônicas, causadas pela doença, mesmo aquelas sem expressão clínica.
Uma conseqüência destes avanços tecnológicos foi a inclusão, a partir de 2001, das informações obtidas a partir da IRM nos critérios diagnósticos, para estabelecer a disseminação temporal e espacial mencionadas acima e assim, juntamente com os dados do exame clínico, possibilitar o diagnóstico da EM já a partir do primeiro evento agudo. Estes critérios vem sendo sucessivamente revistos a cada cinco anos, como forma de torna-los mais sensíveis, identificando novos pacientes sem perder a especificidade, ou seja, o risco de incluir indivíduos com um falso diagnóstico de EM.
Independente da metodologia empregada, seja aquela dos critérios originais de 2001, ou a das revisões de 2005 e 2010, é fundamental a correta interpretação tanto do quadro clínico quanto da IRM. Estes critérios são aplicados de maneira segura quando a manifestação clínica é realmente de natureza inflamatória desmielinizante “do tipo que se encontra em esclerose múltipla”, e quando as lesões da IRM são corretamente interpretadas como “sugestivas de inflamatórias desmielinizantes”.
O aspecto de IRM da lesão aguda na EM correlaciona com o mecanismo da doença: um processo inflamatório erm torno de um vaso sanguíneo, permitindo aumento da passagem de fluidos dos vasos e consequente captação do contraste. Obedecendo a anatomia, estas lesões guardam uma conformação ovóide, com seu maior eixo orientado perpendicularmente aos ventrículos laterais, bem peculiar. Em cerca de 10 a 15 dias, esta lesão aguda evolui, desaparece a captação do contraste, deixando uma cicatriz, um sinal na IRM em sequencia ponderada por T2 e FLAIR, que guarda as mesmas características da lesão aguda que as originou, ovóides e em torno dos ventrículos laterais.
Algumas destas lesões podem ocorrer em áreas cerebrais sem expressão clínica. No entanto sua presença numa IRM de seguimento pode representar elemento de importancia quando avaliamos a eficácia do tratamento. Os conceitos atuais de falha terapeutica ou resposta sub-ótima à medicação tendem a incluir não só elementos clínicos (como a persistencia de surtos ou a progressão da incapacidade), mas também achados de IRM.
O diagnóstico da EM é um diagnóstico clínico e, ainda, de exclusão. Mesmo assim, há que se buscar uma correlação da clínica com a imagem. Critérios diagnósticos vêm evoluindo a partir de nossa prática e expertise, adaptando-se aos avanços da tecnologia, sobretudo da imagem, que deve ser vista como um elemento complementar precioso, uma extensão do exame neurológico, com a finalidade de otimizar a conduta médica.
Referências:
1. Figueira FFA, Figueira GMA. “Magnetic resonance imaging in multiple sclerosis: keys for diagnosis and follow-up”. Latin American Multiple Sclerosis Journal 2012;1(4)187-190
2. McDonald IW, Compston A, Edan G, et al. Recommended Diagnostic Criteria for Multiple Sclerosis: Guidelines from the International Panel on the Diagnosis of Multiple Sclerosis. Ann Neurol 2001;50:121-127.
3. Polman CH, Reingold SC, Edan G, et al. Diagnostic criteria for multiple sclerosis 2005 revisions to the McDonald Criteria. Ann Neurol 2005;58:840-846.
4. Polman CH, Reingold SC, Banwell B, et al. Diagnostic criteria for multiple sclerosis 2010: revisions to the McDonald criteria. Ann Neurol 2011;69:292-302.