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O hormônio conhecido por vitamina D desempenha importante papel não somente no desenvolvimento ósseo, mas também em muitos outros sistemas do organismo. Ela representa, entretanto, apenas uma das substâncias que são sintetizadas na pele, sob o efeito da radiação solar. O papel da vitamina D na saúde humana é foco de pesquisas em diversos centros ao redor do mundo que devem, em um futuro muito próximo, trazer valiosas informações sobre sua real importância na prevenção e tratamento de diversas condições de saúde, incluindo a esclerose múltipla (EM).

Diversas células dos sistemas imunológico e nervoso têm receptores para vitamina D, denominado de Vitamin D receptor  (VDR). Uma vez estimulados, estes receptores geram sinais químicos que irão influenciar a expressão de genes dentro da célula, fazendo com que ela acabe se comportando de uma certa maneira, como por exemplo, dividindo-se. A presença do VDR em neurônios e células do sistema imune significa que a vitamina D afeta de alguma forma estas células.

Estudos laboratoriais mostram que quando células do sistema imunológico são expostos à vitamina D, existe uma diminuição da capacidade inflamatória destas células. Esta é uma das justificativas que motivaram a realização de estudos clínicos para avaliar se a vitamina D tem o potencial para prevenir o desenvolvimento da EM e afetar sua evolução, reduzindo o número e a intensidade dos surtos e a progressão da doença. Alguns estudos estão testando esta hipótese.

O conceito consolidado é o de que a deficiência da vitamina D é prejudicial na EM, devendo ser corrigida e mantida em níveis adequados. Estudos sugerem que a partir de um certo nível, que varia em torno de 50 ng /ml do metabólito 25-hidroxi-vitamina D (sua forma inativa, dosada no sangue), não se observaria benefício clínico adicional. Em função disso, a manutenção de níveis supra-fisiológicos (> 100 ng / ml) é considerada experimental, devendo idealmente ser tratada dentro de um ambiente de pesquisa.

O cuidado com a suplementação por produtos manipulados ainda é um outro problema. Casos de insuficiência renal já foram relatados, inclusive por falha na manipulação da medicação. Em um caso, a superdosagem ficou constatada por meio da análise laboratorial das cápsulas, que continham 4.000.000 UI ao invés de 2.000 UI por cápsula prescrita¹.

Segundo o consenso da Academia Brasileira de Neurologia publicado em 2014, as recomendações atuais são as seguintes²:

  1. É recomendada a dosagem de vitamina D em todos os pacientes com síndrome clinicamente isolada e também EM, independentemente da fase da doença, sobretudo em pacientes que fazem uso frequente de corticosteroides ou anticonvulsivantes.
  2. Níveis da vitamina D abaixo de 30 ng/mL no sangue periférico devem ser corrigidos nos pacientes com EM, em qualquer fase, ou em pacientes com síndrome desmielinizante isolada.
  3. Níveis de vitamina D acima de 100 ng/mL no sangue periférico devem ser evitados até que novas definições sejam estabelecidas.
  4. Até a publicação deste consenso, não existem evidências científicas que justifiquem o uso da vitamina D em monoterapia no tratamento da EM, na prática clínica. Portanto, atualmente, o uso de vitamina D como monoterapia na EM é considerado experimental.
  5. Com base um um estudo, pode-se recomendar o uso da suplementação de vitamina D em doses capazes de manter os níveis séricos entre 40 e 100 ng/mL, pois estes são considerados não tóxicos.
  6. Considerando: i) as diferenças individuais de necessidades de reposição e níveis séricos de vitamina D; ii) que um estudo realizado em indivíduos saudáveis demonstrou que o uso de 5.000 UI de vitamina D por dia, durante 15 semanas aumentou os níveis até 60 ng/mL; iii) doses até 10.000 UI dia foram consideradas seguras, sugere-se doses individualizadas até alcançar níveis entre 40 e 100 ng/mL de 25-hidroxi vitamina D.
  7. Considerando que em pacientes com síndrome desmielinizante isolada baixas concentrações séricas de vitamina D poderiam influenciar o risco relativo de conversão para EM, sugere-se a pesquisa do nível sérico dessa vitamina nesses pacientes e correção, se necessária.
  8. Sendo a vitamina D3 um hormônio seco-esteroide, considera-se que as doses devam ser administradas de modo escalonado. Seria ainda de extrema importância o monitoramento da 25-hidroxi-vitamina D (25-OH-D) no soro antes do aumento das doses, a fim de avaliar se a suplementação está realmente sendo efetiva para o paciente em questão.

Diante do exposto, converse com seu neurologista sobre a suplementação de vitamina D necessária para seu caso e faça correta exposição solar para se beneficiar não somente da vitamina D, mas também das demais substâncias sintetizadas na pele sob a ação do sol, algumas delas já com comprovado benefício sobre o sistema imunológico.

Referências

  1. Marins, T. A., Galvão, T. D. F. G., Korkes, F., Malerbi, D. A. C., Ganc, A. J., Korn, D., … Korkes, H. (2014). Vitamin D intoxication: case report. Einstein (São Paulo), 12(2), 242–244. doi:10.1590/S1679-45082014RC2860
  2. Brum, D. G., Comini-frota, E. R., & Vasconcelos, C. C. F. (2014). Suplementação e uso terapêutico de vitamina D nos pacientes com esclerose múltipla : Consenso do Departamento Científico de Neuroimunologia da Academia Brasileira de Neurologia. Arquivos de Neuro-Psiquiatria, (January).
Thiago Junqueira

Doutorado em Ciências (Neurologia) pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Em sua formação possui Pós-graduação em Nutrologia pela ABRAN. Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia.

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